Procedimentos para uma condução segura e
eficiente de grupos motociclísticos em estradas
Recentemente tive a oportunidade de
acompanhar vários grupos motociclísticos em curtas viagens, ficando abismado
com os procedimentos utilizados para conduzi-los – o que motivou o enfoque
dessa matéria.
Cada grupo parece ter um conjunto de
regras próprio, alguns sensatos, outros nem tanto.
Ao longo de minha carreira motociclística,
pude experimentar o que é organizar e conduzir grupos de motociclistas, e posso
garantir que não é tarefa fácil. No entanto, é perfeitamente possível fazê-lo
com segurança, quando nos atemos a um sólido conjunto de regras que devem ter
sua origem nas particularidades de cada lugar. Por isso, um modelo de condução
utilizado no estrangeiro, por exemplo, pode não ser a melhor solução para a
nossa realidade.
Grupo
Chama-se de grupo de motociclistas
quando duas ou mais motos trafegam juntas, em tal relação de proximidade que
evidencia aos demais usuários da via tratar-se de pessoas que conhecem umas as
outras. Para todos os efeitos, independente de quantas motos estiverem
trafegando juntas, os membros devem ser conjugados em pares, de maneira a ocuparem
apenas uma faixa de rolagem, estando um na diagonal do outro e os pares
separados por distância pertinente. Abaixo verá os pormenores e a justificativa
de cada procedimento adotado.
O
par
Cada par deve ser composto por um
motociclista experiente e um menos experiente. Aquele com maior experiência
toma a posição de liderança à frente e à esquerda da faixa que está sendo
utilizada, enquanto o outro deve ficar na sua diagonal atrás, ocupando o lado
direito da mesma faixa. Pelo menos no momento inicial do percurso. Ao longo do
trajeto esse posicionamento deve-se inverter por vezes, caso seja viável.
Aqui vão as razões para isso: estando um
na diagonal do outro, obtém-se o melhor posicionamento pois permite que ambos
os pilotos tenham visão um do outro, o tempo todo. Vistos de longe, tanto pela
frente quanto pelas costas, formam uma massa maior e mais fácil de ser
visualmente identificada por outros usuários. Estando na diagonal, ambos os
motociclistas mantém a capacidade de mudar de trajetória, sem interferir com a
trajetória do outro. Quando estão paralelos um ao outro, essa capacidade é
profundamente limitada, e por isso, não deve ser utilizada. Adicionalmente, estando
na diagonal um do outro, permite que ambos tenham plena visão à frente, bem
como à ré, garantindo o controle situacional ao seu redor. Essa premissa também
não pode ser satisfeita quando os pilotos ocupam a parte central da via, um
atrás do outro. O papel do líder é estabelecer o ritmo da estrada, atentar para
quaisquer eventos significativos e sinalizar quando necessário. O papel do
motociclista que faz ala é apenas acompanhar as decisões do líder, observando
que atitude toma e em que tempo, para que lhe sirva como exemplo. Ao longo da
viagem, o líder pode – e deve – ceder sua posição ao menos experiente para que
esse possa demonstrar suas capacidades, estando ainda sob guarda e cuidado do
mais experiente. Nessa posição, o piloto mais experiente pode observar o
comportamento do outro e eventualmente intervir de maneira rápida caso julgue
que algo inapropriado tenha sido executado. A doutrina deve ser sempre
espelhada na segurança.
Posicionamento
na estrada
Quanto mais membros estiverem viajando
juntos, mais lento será o deslocamento de todo o grupo. Grupos com mais de 20
motos quase sempre acabam se deslocando em velocidades inferiores às do fluxo
ao seu redor. É importante que os organizadores desses eventos tenham ciência
disso e tomem atitudes que visem a segurança de todos, bem como da projeção de
uma imagem positiva do motociclismo.
Via de regra, em estradas de mais de uma
pista, deve-se adotar a pista da direita para o deslocamento do grupo,
utilizando-se a(s) pista(s) à esquerda para eventuais ultrapassagens, que
porventura se façam necessárias. A exceção somente deveria existir caso a pista
utilizada ofereça risco aos motociclistas, por defeitos, buracos ou excesso de
sujeira na via.
Em estradas de pista simples, é
importante que haja separação entre os pares para que outros veículos possam
utilizar o espaço formado entre eles para escalar o grupo através de curtas
ultrapassagens.
Justificativa: Se a via ocupada for a da
esquerda, (estradas multi-pistas) em ritmo abaixo ao do fluxo, o grupo obriga a
quem quer, e pode andar mais rápido, a executar ultrapassagens pela direita, o
que é além de inseguro, proibido. Assim como é proibido pela nossa legislação
bloquear a faixa da esquerda, sem ceder passagem. Se acontecer qualquer
eventualidade, também será mais fácil migrar para o acostamento estando na
pista da direita, do que se estivesse na pista da esquerda. Principalmente em
grupos grandes.
Alguns grupos usam membros para auxiliar
no processo de condução do grupo. Se for incumbido do papel, exija
identificação apropriada, para que seja notado como tal pelos outros membros.
Jamais trafegue com pisca-alerta ligado para cumprir essa função. Além de poder
provocar confusão, é proibido trafegar nessas condições, estando sujeito à
multa.
No caso das estradas de pista simples,
um bloco sem separação entre os membros não oferece condição de ultrapassagem.
Mais adiante, entenderá através de exemplos como isso afeta o tráfego e a
imagem do motociclismo.
Separação
A separação adequada entre pares de
motos é de dois segundos de distância. Esse é o tempo médio que um
motorista/motociclista precisa para reagir a um evento inesperado, segundo
estudos norte-americanos feitos na década de 1950 – e válidos até hoje. No
entanto, em estradas de múltiplas faixas onde há pelo menos dez segundos de
visão à frente, esse espaçamento pode ser inferior, mas ainda assim, tem de
existir. A justificativa do procedimento reside na proposição de um eventual incidente
que acarrete colisões posteriores, por falta de espaço e tempo para reação. O
famoso engavetamento. A distância apropriada é obtida em função da velocidade,
daí ser dada em tempo e não distância física. Para calcular a separação de dois
segundos, basta notar um ponto fixo no solo por onde passou o par à sua frente
e iniciar uma contagem mental. Caso chegue ao mesmo ponto dentro dos dois
segundos, estará a uma distância adequada do grupo a frente. Caso passe antes
de findar a contagem, estará próximo demais, exigindo maior afastamento. Com a
prática, desenvolve-se o senso de distância apropriado para diferentes
velocidades.
Imagem
prejudicada
Agora, imagine-se em um carro, em uma
estrada de pista simples e muitas curvas, chegando a um compacto grupo de
motociclistas desenvolvendo uma média inferior à da estrada. Ao olhar o grupo,
se não houver separação entre os pares, não encontrará oportunidade de
ultrapassagem, pois o comprimento de todo o grupo inviabilizaria tal ação. Veja
que imagem do motociclismo está sendo projetada! Temos de ter em mente que a
via é de todos – ainda que alguns grupos se comportem como se fossem donos das
estradas. É preciso exercer a cidadania e oferecer a oportunidade de passagem a
quem assim desejar, pois as pessoas ao nosso redor não tem que ser forçadas a
andar em nosso ritmo, se assim não desejam. Há ainda a questão da relação de
proximidade com veículos com massa muito superior à nossa. Em caso de qualquer
conflito, seremos sempre a parte mais fraca. Então porque criar esse tipo de
situação desnecessariamente? A separação adequada, nesse caso, garante a
possibilidade de um veículo mais veloz poder executar a ultrapassagem de pares,
sem conflitar com o grupo. A pouca interferência que a ultrapassagem pode
causar é apenas momentânea.
Velocidade
Infelizmente, não são apenas os grupos
compactos e lentos que trazem problemas nas estradas e denigrem a imagem dos
motociclistas. Grupos velozes, geralmente envolvendo motos esportivas, também
pecam quando saem em bando e transformam nossas vias em suas pistas de corridas
particulares. Se utilizassem a metodologia descrita acima, também se
beneficiariam de uma pilotagem muito mais prazerosa e segura. Para esses grupos,
a velocidade é o ponto crucial – velocidade de ultrapassagem, no caso. É
preciso ter em mente que a ultrapassagem de qualquer veículo é sempre de
responsabilidade daquele que se propõe a executar a manobra, devendo executá-la
de maneira que seja segura pra si e para aquele que se esteja ultrapassando.
Quando em grupo, a postura ideal é se aproximarem cuidadosamente do veículo que
pretendem ultrapassar, como um par, usando de toda a largura da faixa. Assim
que seja oportuno, ambos executariam a ultrapassagem como um carro faria, invés
de ultrapassar um de cada vez com velocidade maior. O que se garante dessa
diretriz é que haverá mais tempo para interação entre os motociclistas e
motoristas, permitindo que haja ciência do que está para acontecer por todos os
envolvidos, facilitando-se o processo. Os problemas começam a acontecer quando
o tempo de interação diminui, em função de velocidades incompatíveis na aproximação.
O pouco tempo acaba gerando manobras abruptas e de maior risco para todos.
Conclusão
É perfeitamente viável criar um ambiente
seguro para motoristas e motociclistas quando algumas regras básicas de
convívio e técnica de segurança são aplicadas. O que não podemos, nem devemos,
é nos conformar com atitudes de poucos e depois padecer com políticas
esdrúxulas formuladas em função dessa minoria.
Se você está em um grupo indo viajar de
moto, questione os procedimentos que serão executados. Não se coloque em
situação de risco porque alguém estabeleceu uma forma de conduta que não
consegue justificar, ou que não lhe pareça segura. Opine, exponha suas dúvidas
e critique procedimentos que não podem ser sustentados à luz da lógica. Viajar
em grupo de moto é muito prazeroso – não permita que procedimentos equivocados,
ou a falta dos mesmos, comprometam seu prazer e principalmente, sua segurança.
Se ainda assim não conseguir modificar a forma como o grupo é conduzido,
escolha um ou mais amigos que compartilhem de sua opinião e façam sua própria
viagem. Mais cedo ou mais tarde, esses organizadores vão notar que o grupo não
é mais um grupo, e terão de rever a forma como é conduzido.
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